A Era do Consumo

Nossa vida é feita de ações, e portanto, verbos. Sem sombra de dúvidas, "consumir" consiste num dos verbos mais praticados pelo homem contemporâneo. Vou dar um exemplo genérico para realçar a forte presença do consumo em nossa sociedade: 

Ao acordar, a maioria de nós já pratica seu primeiro ato de consumo: o uso do despertador. Sim, pois além de o despertador ser um produto proveniente de uma relação de consumo, sua utilização depende ou do uso de pilhas, outro produto de consumo, ou do uso da energia elétrica, que será fornecida por meio de um prestador de serviço resultante de uma outra relação de consumo. Há, ainda, quem utilize a função despertador de seu aparelho celular que, por sinal, consiste num dos eletrônicos mais vendidos no Brasil e no mundo e é por muitos considerado como produto de caráter essencial. Aliada ao aparelho celular está a operadora de serviços que disponibiliza o sinal telefônico, representando mais uma relação de consumo. Mal acordamos e já praticamos por diversas vezes o verbo consumir. Para muitos o próximo passo é o banho, que está atrelado a vários serviços (água, energia elétrica, gás) e produtos (sabonete, shampoo, condicionador, desodorante, perfume, creme, secador de cabelo e por aí vai). Ao ir ao trabalho, as pessoas podem optar entre um veículo próprio (produto de consumo), que muitas vezes possui um seguro-acidente (serviço de consumo), ou entre um transporte público, como o ônibus e o metrô, que são exercidos por meio de prestadoras de serviço. A narração se limitou até a ida ao trabalho apenas e mesmo assim a utilização das palavras "consumo", "produto" e "serviço" deixou o texto saturado. Agora mesmo, ao acessar o blog, o leitor utiliza a internet (serviço) por meio de um computador (produto).


Inevitável, portanto, o ato de consumir nos dias de hoje. Mesmo não querendo, consumimos, e muito. Justamente por isso vivemos na chamada "sociedade de consumo". Mas nem sempre nossa sociedade foi dessa forma caracterizada. Apenas a partir do período pós-Revolução Industrial que o mundo entrou na era do consumo nos moldes parecidos com o dos atuais. Isso se deu em razão do crescimento populacional nas metrópoles, de modo que a indústria em geral passou a produzir mais, para vendar para mais pessoas. Para tanto, utilizou-se da produção em série, o que possibilitou uma diminuição profunda dos custos e um aumento enorme da oferta. Iniciou-se, assim, a distribuição em massa de produtos e serviços. Consequentemente, a publicidade desses produtos e serviços passou a ser efetuada em grande escala também. Com a globalização, ocorreu uma intensificação desse modelo "standartizado", caracterizado pelo contrato modelo (contrato de adesão) e pela facilitação generalizada do crédito direto ao consumidor. Logicamente, instaurou-se uma situação de desigualdade entre consumidores e fornecedores. Por esse motivo, surgiu um movimento consumerista de caráter mundial, visando uma proteção ao consumidor em razão de sua vulnerabilidade e hipossuficiência, haja vista as peculiaridades da sociedade de consumo.  


No Brasil, em 1990, foi editado o Código de Defesa do Consumidor, que proporcionou um tratamento diferenciado e privilegiado ao polo mais fraco da relação de consumo, o que antes não era possível em razão do caráter privatista do Código Civil. Vinte anos já se passaram da primeira codificação brasileira sobre relações consumeristas e novas questões vão surgindo em razão das mudanças sociais. A preocupação com o meio ambiente, o surgimento da internet de modo comercial e a instabilidade da economia mundial, por exemplo, suscitam questões como o consumo sustentável, o comércio eletrônico e o superendividamento. 


A criação do blog "A Era do Consumo" se deu, portanto, em razão da importância e relevância das relações de consumo em nossa sociedade atual. Destinado não apenas aos operadores de direito, mas também, e principalmente, ao público em geral, o blog tem como objetivo reunir notícias e decisões judiciais na área do Direito do Consumidor, bem como analisar e discutir questões pontuais que fazem parte da atual Era do Consumo.






Ana Paula Mangrich